“Uma meia-verdade não deixa de ser uma mentira inteira”. Dizem que essa citação faz parte da sabedoria iídiche. Na política brasileira, as meias-verdades são alardeadas com a intenção de seduzir o eleitorado, criar factoides e gerar expectativas. Em Itabirito, não é diferente.
Recentemente, foi divulgado “extraoficialmente” nas redes sociais um documento do Departamento de Edificações e Estradas de Rodagem de Minas Gerais (DEER-MG), datado de 9 de dezembro de 2019, assinado pelo diretor-geral do órgão, Fabrício Sampaio, autorizando a transferência para o município de Itabirito do km 60,7 ao km 64,2 da MG-30.
O trecho não é pavimentado e é conhecido como “estrada do Marzagão”. Tal estrada é um pesadelo há anos para os moradores locais. Barro em época de chuva, e poeira em tempos de seca.
Fica a pergunta: já que o documento do DEER-MG prova que houve a municipalização do trecho, então significa que a estrada será finalmente pavimentada? Resposta: isso depende de dois fatores: 1- Verba para a pavimentação, que pode sair dos cofres da prefeitura ou (provavelmente) a administração deve pedir à Vale (empresa que usa a estrada) e 2- Licenças ambientais que a Prefeitura de Itabirito tem de conseguir.
A peleja para obter a municipalização
O primeiro passo (a municipalização) só pôde ser dado por causa da Lei 3324, de 08/07/2019, que fez parte da revisão do Plano Diretor de Itabirito.
A lei em questão definiu os novos perímetros urbanos do município de Itabirito, e foi elaborada durante o governo interino do prefeito Arnaldo dos Santos (MDB). Somente por causa dessa lei é que o governo do Estado pôde fazer a “desafetação” do trecho. Inclusive, a lei é citada no documento do DEER-MG.
Por meio dessa lei, a estrada do Marzagão foi incluída no perímetro urbano de Itabirito. E estrada que está “dentro do município” passa a ter status de rua (ou avenida).
Contudo, a atual administração da Prefeitura, com o engajamento da militância nas redes sociais, tentou passar a ideia de que a conquista foi única e exclusivamente do prefeito Orlando Caldeira (Cidadania), o que não corresponde à total realidade dos fatos.
Em face de como a notícia foi dada e sobretudo disseminada, os mais incautos acabaram tendo a impressão de que o asfaltamento da via é algo corriqueiro e poderá ser entregue logo.
Infelizmente ou felizmente, a “realidade” dos fatos é muito diferente da “realidade” disseminada nas redes sociais por militantes engajados.
E, todavia, antes de “jogar” o asfalto. É preciso primeiro corrigir os problemas erosivos, fazer a drenagem do trecho e, o mais complicado, conseguir as tais licenças ambientais.
Por ser um resquício de mata atlântica com transição para o cerrado, o Marzagão é enquadrado dentro da APA-Sul (Área de Proteção Ambiental ao Sul da Região Metropolitana de Belo Horizonte). Qualquer interferência na região precisa ter a anuência do Conselho Consultivo dessa área. E tal conselho é uma câmara técnica de outro conselho: o Copam (Conselho Estadual de Política Ambiental).
Papel da Câmara e do deputado
Mas não é somente pela vontade única e exclusiva de prefeitos (interinos ou eleitos) que se faz a municipalização de uma via.
Foram inúmeras as reuniões em que o vereador Ricardo Oliveira (Cidadania) participou para tentar viabilizar a municipalização (na Vale, no DEER-MG, com o governo do Estado etc). Inclusive, seus discursos, na Câmara, sempre abordaram o tema.
Além das reuniões, o vereador Ricardo, com aval do presidente Arnaldo, promoveu uma Audiência Pública para discutir o assunto.
O futuro presidente da Câmara, vereador Renê Butekus (PSDB), também se empenhou pela conquista, e ele divide os méritos: “eu, o Ricardo Oliveira, o Gilmar Capoeira, o Arnaldo, o Nilson Tem Tudo nos esforçamos com o intuito de conseguir essa municipalização. O João Vitor Xavier (deputado estadual) também teve papel fundamental ao pressionar o governo do Estado para que houvesse a municipalização”, contou Renê.
Inclusive, o vereador Gilmar Capoeira fez um requerimento pedindo a municipalização do trecho.
Tal requerimento (enviado à Prefeitura e ao DEER-MG) foi escrito com base em um documento, feito por vereadores de Ouro Preto, que conseguiram a municipalização de trecho da BR-356, trecho esse que passa pelo município ouro-pretano. “Enquanto eu não vir a estrada do Marzagão pavimentada, eu não vou sossegar”, afirmou Capoeira.
Todavia, como o internauta pôde perceber, o problema está longe de terminar e, infelizmente, as coisas não são tão simples e fáceis como se fazem parecer nas redes sociais.
Matéria especial
Reportagem de Romeu Arcanjo com colaboração de Marcelo Rebelo